Considerado um dos elementos-chave de um futuro energético renovável, o hidrogênio verde está cada vez mais presente nas estratégias de desenvolvimento do meio ambiente. Seu potencial como eixo de uma economia concreta se materializa nos conhecidos como “vales de hidrogênio”, ecossistemas estruturados para facilitar a produção e consumo deste vetor energético, para manter seu uso na indústria e potencializar o alcance de setores como o transporte, a atividade institucional ou a cidadania.
Nos últimos anos foram essenciais para o estabelecimento do hidrogênio como vetor energético, com importantes avanços no campo industrial, mas também com primeiros passos em áreas como o transporte de cargas, como explica Javier Brey, presidente da Associação Espanhola do Hidrogênio em uma entrevista recente para a Revista Gestão de Riscos e Seguros. Este contexto favorável foi reforçado pela a Espanha em dezembro de 2021, com a aprovação do Projeto Estratégico de Recuperação e Transformação Econômica (PERTE) na área de energias renováveis, que mobilizará um investimento superior a EUR 16,3 milhões – com uma contribuição do setor público de EUR 6.900 e um investimento privado previsto de cerca de EUR 9,5 milhões. O hidrogênio, vetor fundamental para alcançar um futuro energético limpo, seguro e acessível, é o elemento do PERTE que mais recebe apoio: EUR 1,555 milhões, que mobilizarão outros EUR 2,8 milhões de capital privado.
Nesse cenário futuro, uma das prováveis opções serão os chamados “vales do hidrogênio”, que já começam a se formar em países como Espanha e Argentina, e que poderão ser a base de uma economia do hidrogênio.
O que é um vale de hidrogênio?
Essas iniciativas partem de uma visão de progresso, pois se baseiam na descarbonização das economias e no avanço do hidrogênio verde, obtido a partir de fontes renováveis. Como Javier Brey nos explicou na entrevista acima, a produção sustentável seria realizada “por meio da eletrólise se usarmos uma fonte renovável como energia elétrica, fotovoltaica, eólica, etc. Na hora de utilizá-lo em motores de uma turbina ou em células de combustível, não emite dióxido de carbono para a atmosfera. Ou seja, um combustível limpo desde sua produção até sua utilização”. As condições regulatórias, climáticas e sociais fazem da Espanha uma região com grande potencial de integração.
Mas que são exatamente os vales de hidrogênio? Falamos de ecossistemas estruturados para facilitar a produção e o consumo de hidrogênio sustentável em uma área determinada, que permitiria integrar a corrente de valor deste vetor energético para além do campo industrial, ainda que como base estratégica. A produção e a capacidade de distribuição de hidrogênio verde – isto é, produzido com energias renováveis -, no território seria o ponto de partida para criar um meio favorável à sua distribuição e uso. Em alguns casos, os esforços estão voltados para uma área determinada, como a atividade portuária ou o transporte de cargas. Em outros, o objetivo é mais amplo, orientado para a demanda energética da população ou a projeção para o exterior através de hidrodutos.
Para alcançar a integração setorial do hidrogênio em um território, é necessário promover clusters que reúnam empresas de dentro e de fora do setor de energia, além de um compromisso das administrações públicas. Esse compêndio de agentes costuma estar vinculado a pontos de consumo de hidrogênio de origem fóssil, para substituí-lo por hidrogênio renovável.
Casos de sucesso promissores
Com o impulso estratégico frente à emergência climática, a busca de uma integração do hidrogênio gerado por energias renováveis transformou-se em uma prioridade para muitas administrações que tratam de abrir um espaço em suas indústrias e economias para este vetor energético de forma rentável. Uma das regiões com maior potencial, devido à sua grande experiência energética e à sua posição geoestratégica na futura rede de hidrodutos espanhola e europeia é Tarragona, que já tem um importante projeto em construção: o Vale do Hidrogênio da Catalunha, lançado em outubro de 2020 para reunir todos os agentes necessários à promoção do conhecimento, produção e implementação desta alternativa energética. Nestes dois anos, transformou-se em uma iniciativa estratégica plenamente consolidada em que participam mais de 70 empresas e mais de 50 órgãos públicos, além de centros de investigação e estudo. Segundo afirmam no vídeo de apresentação do projeto, “a União Europeia e os governos têm o firme compromisso de iniciar uma transição para a era do hidrogênio renovável, descarbonizar os principais setores econômicos, criar produtos novos sem gerar pegada de carbono, fortalecer as energias renováveis graças à capacidade de armazenamento do hidrogênio e implementar o uso em todas as formas de mobilidade, além do âmbito residencial”.
Esta transformação afeta diretamente numerosos setores, como o transporte de mercadorias ou o setor químico, que permitirá a criação de milhares de postos de trabalho. O desenvolvimento de estruturas que alinhem os principais agentes da sociedade (universidades, indústria e administração) em torno da corrente de valor do hidrogênio pode atrair importantes investimentos e fortalecer o bem-estar de uma região.
Nesta linha, em outubro de 2021 foi apresentado outro projeto na Espanha, o H2VLC, um vale de hidrogênio apoiado pela Prefeitura de Valencia. Este plano tem o propósito de impulsionar, em particular, o uso de hidrogênio verde no setor do transporte e a logística na área metropolitana e no Porto de Valencia. No ponto de partida contaram com a adesão imediata de mais de 40 empresas, entidades e instituições. Esta iniciativa, cuja coordenação técnica recai na Universidade Politécnica de Valencia (UPV), tem segundo a instituição formativa “um orçamento global superior aos 170 milhões de euros, e conseguirá o apoio financeiro do Plano de Recuperação, Transformação e Resiliência do Governo da Espanha”. Dentro deste programa, José E. Capill, reitor da UPV, anunciou a intenção de incluir 21 projetos de alto impacto que contemplam “desde a construção de infraestruturas específicas para geração e dispensação de hidrogênio verde para transporte, até a aquisição de caminhões, ônibus, vans, veículos de logística urbana e industrial movidos pelo que é considerado o combustível do futuro”.
No norte do país podemos encontrar outro centro especializado, conhecido como Corredor Basco do Hidrogênio (BH2C), que conta com a participação de oito instituições, 12 centros de conhecimento e associações e 58 empresas. Em sua declaração de intenções, o corredor fundamenta-se “em uma estratégia integral, que inclui 34 projetos de toda a corrente de valor e será uma alavanca para transformar o tecido produtivo e conseguir manter o peso da indústria” na economia regional. Com uma base de colaboração público-privada, a BH2C “combina as dimensões econômica, social, tecnológica e ambiental, entre outras, graças ao investimento de mais de EUR 1,3 milhões de euros até 2026, gerando mais de 1.340 empregos diretos e 6.700 empregos indiretos”. Com respeito a seus objetivos concretos de sustentabilidade, a intenção é atingir a produção de 20 mil toneladas anuais de hidrogênio verde que neste prazo de quatro anos “evitarão a emissão de 1,5 milhões de toneladas de CO2, dirigindo o foco durante os primeiros anos para as infraestruturas e aplicativos necessários para a implantação de um corredor que marcará o antes e o depois na transição energética basca”.
O apoio institucional, objetivos claros de sustentabilidade e o fluxo exponencial de investimento estão delineando, como pode ser visto com estes exemplos de desenvolvimento concreto em nossa geografia, um futuro promissor que pode atender às expectativas da Espanha de se consolidar como uma potência internacional e referência na economia do hidrogênio.