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O programa Copérnico, uma aposta europeia por um planeta

Criado há 20 anos em Baveno (Itália), o programa Copérnico surgiu para responder à necessidade de dispor de serviços autônomos e independentes de informação geoespacial, em particular sobre questões meio ambientais e de segurança. Em princípio ia ser um projeto com poucos milhares de usuários mas, graças à evolução tecnológica, converteu-se no maior fornecedor de dados de observação da Terra, com quase 275.000 usuários registrados no portal de dados Sentinel da Agência Espacial Europeia (ESA).

Liderado pela União Europeia (UE) e com a ESA como principal sócio, Copérnico é o programa de observação e monitoração da Terra “mais ambicioso” até o momento e o primeiro no mundo em volume de dados proporcionados, como reconhece María Pilar Milagro-Pérez, especialista técnica do Escritório Espacial de Copérnico da ESA.

Seus resultados são relevantes já que facilitam aos países a adaptação a fenômenos globais como a mudança climática, a gestão do solo, a poluição atmosférica e o estado dos mares com a adoção de políticas locais, regionais e europeias adequadas. “Põe à disposição dos cidadãos, autoridades públicas, responsáveis políticos, cientistas, empreendedores e empresas um extenso mundo de informação e conhecimento sobre nosso planeta, de maneira completa, aberta e gratuita”, resume Milagre-Pérez.

Estructuração do programa

Para entender o funcionamento do programa Copérnico é preciso ter em conta que está estruturado em três componentes, como resume a cientista:

Componente espacial. Garante observações espaciais sustentáveis para os serviços e está formada por missões satelitais dedicadas, como as Sentinel. Estas missões transportam as tecnologias mais avançadas para a observação da Terra – como instrumentos radar ou multiespectrais – para poder monitorar qualquer mudança no terreno, nos oceanos ou na atmosfera. O componente espacial do programa também se apoia em infraestruturas já existentes conhecidas como “missões colaboradoras”, com mais de 30 satélites que proporcionam dados complementares.

Além disso, existe um segmento terrestre que permite a distribuição dos dados coletados para a comunidade de usuários. Uma vez obtidos pelos sensores de cada satélite, são enviados através de estações de recepção para a terra, entre as quais está a de Maspalomas, na ilha de Grã Canária, dependente do INTA (Instituto Nacional de Técnica Aeroespacial). Nesta e em outras estações, os dados, se têm de ser distribuído em tempo real aos usuários, são processados e depois disseminados e arquivados. Se não, são mandados diretamente para centros específicos distribuídos por toda a Europa, onde se processam e se disseminam. Uma rede veloz de Internet ocupa-se de distribuir os dados às plataformas de acesso aberto.

Componente de serviços. Garante o fornecimento de informação para diferentes áreas de aplicação: vigilância da atmosfera e do meio ambiente marinho e do território, mudança climática, gestão de situações de emergência e segurança. Estes serviços transformam os dados de satélites e, in situ, em informação de valor agregado nessas áreas graças ao processamento e à análise dos mesmos, a sua integração com outras fontes e à validação dos resultados.

Componente in situ. Garante a realização de observações mediante sensores colocados nas beiras dos rios, flutuando no oceano ou instalados em balões meteorológicos, barcos, etc. As medidas in situ são utilizadas para calibrar, verificar e complementar a informação proporcionada pelos satélites, o que as torna essenciais para fornecer dados confiáveis e consistentes no tempo.

Coordenação da UE e a ESA

A Comissão Europeia (CE) é a encarregada de desenvolver a visão política e coordenar o programa. Para a implementação operacional e a gestão dos serviços de segurança, a CE confia em organizações e agências europeias com a experiência adequada, como o Centro Comum de Investigação (JRC) para a coordenação dos serviços terrestre e de emergência, o Centro Europeu de Previsões Meteorológicas a Médio Prazo (ECMWF) para a mudança climática e a vigilância da atmosfera ou o Mercator Océan para os serviços marinhos.

A gestão do componente espacial, incluindo a construção e o lançamento de alguns satélites, corresponde à ESA, que também age como arquiteta dos sistemas satelitais e assegura sua coordenação técnica e se encarrega, junto com a Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT), da coordenação das operações.

Trata-se, em suma, de um “esforço de colaboração genuinamente europeu”, destaca Milagro-Pérez, dado que os estados membros da UE e da ESA contribuem com o programa de múltiplas maneiras: através do desenvolvimento de satélites sob a gestão e supervisão da ESA (como o satélite PAZ, primeiro satélite radar de abertura sintética espanhol, construído pela Airbus e lançado em 2018), da provisão de dados procedentes das infraestruturas espaciais nacionais e do fornecimento de dados in situ.

O sustento econômico do projeto Copérnico também depende da UE e da ESA, responsáveis pelo compromisso financeiro a longo prazo. Até o momento foram investidos no programa quase 8.000 milhões de euros e espera-se um investimento adicional nos próximos anos para completá-lo e responder a novos requisitos e políticas ambientais.

Os estados membros também participam, sob a coordenação da ESA, financiando e desenvolvendo os “segmentos terrestres colaborativos”, que contam com estações próprias de recepção, centros de processamento e arquivo de dados, assim como aplicações específicas de cada país, etc. Isto permite ter acesso direto aos dados dos Sentinel.

Incentivo para o desenvolvimento industrial

Em 8 de outubro de 2018 a missão Copérnico Centinela-1 capturou as primeiras imagens do derramamento de hidrocarbonetos de uma colisão entre dois barcos que tinha ocorrido no dia anterior no Mar Mediterrâneo, ao norte da Córsega.

Os principais objetivos de Copérnico são, tal como destaca Milagro-Pérez, de caráter eminentemente social: administrar melhor o consumo e o uso dos recursos naturais da Terra e proteger o meio ambiente; compreender as causas e consequências da mudança climática e preparar medidas de mitigação e adaptação adequadas; responder com eficácia aos possíveis desastres e crises humanitárias; garantir a segurança e a qualidade de vida dos cidadãos.

Mas a política aberta e global de dados estimula, além disso, a criação de numerosos avanços industriais. Daí que as informações facilitadas sejam empregadas por muitos setores. “Para proporcionar a grande maioria dos dados, análises, previsões e mapas de maneira gratuita, Copérnico contribui para o desenvolvimento de aplicações e serviços inovadores”, reconhece a especialista. De fato, uma de suas principais contribuições é contribuir para a excelência da pesquisa e indústria espacial europeia, bem como participar no desenvolvimento contínuo das capacidades industriais e científicas da Europa.

No setor energético, a monitoração e medida da radiação solar que realiza o serviço Copérnico de vigilância da atmosfera permite às empresas decidir onde instalar parques eólicos ou usinas solares e, ainda, calcular a quantidade de energia solar que pode produzir o telhado de certas instalações

O planejamento urbano, a arqueologia ou a navegação marítima são outras indústrias que se beneficiam da informação obtida para desenvolver seus produtos e serviços. As empresas tecnológicas elaboraram produtos específicos de grande utilidade para o setor agrícola, como fertilizantes e pesticidas, assim como uma ampla gama de aplicações meio ambientais e de segurança de grande impacto empresarial, como a resposta a emergências, a detecção de derramamentos de petróleo, a vigilância marítima ou o acompanhamento da expansão territorial.

 

Novos avanços

Embora tenha sido posto em funcionamento há duas décadas, não foi até 2014 quando se lançou o primeiro satélite dedicado, o Sentinel-1 (dois anos antes entrou em operação o serviço de vigilância do território, o primeiro do programa que gradualmente está sendo seguido pelo resto). Desde então, foram lançados outros 6 satélites Sentinel e está prevista a decolagem de outros 8 nos próximos anos, junto com 5 instrumentos que voarão em satélites da EUMETSAT. Além disso, a lista de missões satelitais colaboradoras de Copérnico aumenta a cada ano.

Perante o futuro, como lembra Milagro-Pérez, recolheram-se nos últimos anos petições dos usuários particulares, empresariais e públicos para melhorar a monitoração de nosso planeta e adaptar-se às novas necessidades. Daí que se tenham identificado novos requisitos para aprofundar nas missões espaciais em um futuro próximo, como a estimativa das emissões de dióxido de carbono antropogênico, observações térmicas da superfície terrestre de alta resolução, monitoração das plataformas de gelo e do gelo marinho nas regiões polares, sensores hiperespectrais do território ou observações radar de abertura sintética em banda L.

As oportunidades industriais do projeto são numerosas, até o ponto de que a cientista da ESA alude a recentes estudos realizados pela CE que mostram que Copérnico, a partir de 2020, gerará 1.000 milhões de euros de receita apenas para a indústria espacial e criará 4.000 postos de trabalho a cada ano. Do ponto de vista social, os benefícios são também importantes: o projeto proporcionará entre 67 e 131 mil milhões de euros em proveito da sociedade europeia entre 2017 e 2035, o que supõe entre 10 e 20 vezes o custo do programa.

Estes dados atestam que, graças a sua política de gratuidade da informação, incentivou-se a criação de novos modelos de negócio em torno dos serviços e dos dados proporcionados, estimulando a economia e criando emprego.

O sistema Copérnico

Fonte: Copernicus

Colaborau neste artigo

María Pilar Milagro-Pérez é graduada em Física pela Universidade de Zaragoza e conta com um Ph. D. em Física do Plasma pela Universidade Tor Vergata de Roma.

Conta com mais de 20 anos de experiência profissional no setor de sensoriamento remoto via satélite. De 1999 a 2007 trabalhou em aplicações do sensor radar altímetro a bordo do Envisat, satélite meio ambiental da ESA, verificando algoritmos e avaliando os produtos provenientes desse instrumento.

Desde 2008, trabalha no Escritório Espacial de Copérnico da Agência Espacial Europeia, em Frascati (Itália). Seu trabalho consiste em coordenar os aspectos técnicos do componente espacial do projeto, dando suporte na análise técnica e programática do estado do componente espacial e de sua evolução futura.

 

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