O denominado “gelo combustível”, extraído do leito marinho, pode se tornar a grande fonte de energia do futuro. Segundo os investigadores, se as técnicas de extração forem aperfeiçoadas, seria possível garantir mil anos de consumo energético mundial.
Mesmo que muitas pessoas ainda não tenham ouvido falar, há décadas que inúmeros países realizam pesquisas nesta matéria, que combina moléculas de água e gás natural localizadas em zonas marinhas de grande profundidade, e também em diversos solos gelados (permafrost*), como as tundras.
A China é um dos países que está desenvolvendo a tecnologia que possibilitaria sua obtenção. No ano passado, as autoridades anunciaram como um grande sucesso a primeira extração conseguida nas águas próximas à cidade de Hong Kong, a 1.266 metros de profundidade. Segundo informou a mídia desse país, durante oito dias foram extraídos 8.350 metros cúbicos diários desta possível fonte energética.
Considera-se que a extração pode representar uma autêntica revolução energética, pois as autoridades do país calculam que só na China podem existir reservas de gelo combustível equivalentes a 80 mil toneladas de petróleo, número suficiente para alimentar todas as necessidades energéticas dessa nação durante aproximadamente duas décadas.
Que é o gelo combustível
Foi descoberto pela primeira vez na antiga União Soviética, nos anos 60. Trata-se de uma fonte de energia com aspecto de gelo, do qual deriva seu nome, mas que produz água, por um lado, e gás natural, pelo outro, ao ser fundido ou despressurizado. É produzido pelas excreções de bactérias que habitam em ambientes tão difíceis para a vida como as profundidades abissais ou o chamado permafrost (que é o solo permanentemente congelado). Ainda, existem diferentes tipos de gelo combustível. As autoridades chinesas, por exemplo, estão trabalhando com o hidrato de metano, um dos mais abundantes.
Tem o aspecto de gelo, mas ao ser despressurizado ou fundido gera água, por um lado, e gás natural, pelo outro
Esta estrutura é estável em muito baixas temperaturas e altíssimas pressões. Em condições normais de temperatura e pressão, sua decomposição libera metano, o gás natural comum, e água. Um metro cúbico de gelo combustível equivale a nada menos que 164 metros cúbicos de gás natural.
“Parecem cristais de gelo, mas quando você olha de perto, a nível molecular, é possível ver as moléculas de metano encerradas dentro das moléculas de água”, explicava Praven Linga, professor do Departamento de Engenharia Química e Biomolecular da Universidade Nacional de Cingapura, em declarações à cadeia britânica BBC.
A China e o Japão, dois países com alto consumo energético e escassos de jazidas de hidrocarbonetos, foram as nações mais interessadas em desenvolver um possível uso comercial desta fonte de energia. Outros países líderes na exploração do gelo combustível são a Índia e a Coreia do Sul, que também não possuem reservas próprias de petróleo. Enquanto os Estados Unidos e o Canadá também são ativos nesse sentido. O foco de suas explorações foram os hidratos de metano sob o permafrost, no norte do Alasca e no Canadá.
Algumas discrepâncias
Contudo, existem muitas dúvidas e temores por parte da comunidade internacional em função dos possíveis danos ao meio ambiente que sua extração poderia causar. O problema é que o metano é altamente explosivo e sua extração pode provocar grandes riscos. Neste caso, o perigo potencial é que o metano escape e isso traria consequências graves para o aquecimento global, já que se trata de um gás cujo impacto potencial na mudança climática seria muito mais elevado que o dióxido de carbono. No entanto, a China assevera que a geração de energia, mediante a combustão de hidrato de metano, produz 20% menos de emissões contaminantes que o petróleo, e 40% menos que o carvão, matéria que continua sendo dominante no setor energético desse país
O problema é que o metano é altamente explosivo e sua extração pode causar grandes riscos
Por sua vez, Lin Boquiang, diretor do Centro para a Economia Energética da Universidade de Xiamen da China, afirmava em uma entrevista publicada pela agência EFE que o gelo combustível “é uma fonte de energia bastante limpa e que se encontra em grandes quantidades”. Assim, argumentava que “se a China conseguisse aplicá-la, seria uma grande contribuição, apesar de que o problema é o desenvolvimento da tecnologia necessária”.
Um metro cúbico desta substância libera cerca de 160 metros cúbicos de gás. Isto significa que é um combustível de grande intensidade energética.
No entanto, o inconveniente é a extrema dificuldade na extração deste gás e o grande consumo de energia durante o processo.
As reservas
O gigante chinês acredita que se as técnicas de extração e de obtenção de energia forem aperfeiçoadas, questão que pode demorar entre 10 e 30 anos, haverá reservas para assegurar mil anos de consumo energético global. Existem grandes jazidas sob todos os oceanos do globo, sobretudo nas beiras das plataformas continentais, como a grande fossa que se estende por 8 mil quilômetros no fundo do Oceano Pacífico, e que se situa entre a América Central e o Havaí.
“Apesar de ser verdade que o sucesso da China representa um avanço importante, é só um passo em um longo caminho”, indicava em suas declarações o professor Praven Linga.
Conforme asseverava, “é a primeira vez que os índices de produção são realmente promissores”. Embora acrescentou que “acredita-se que só em 2025 poderemos considerar realistas as opções comerciais”.