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AS SANÇÕES INTERNACIONAIS NO SETOR SEGURADOR E RESSEGURADOR: O TRANSPORTE MARÍTIMO E A CRISE ENERGÉTICA

Desde o princípio da invasão russa na Ucrânia, Bruxelas adotou sete pacotes de sanções contra Moscou, visando quase 1.200 pessoas e quase 100 entidades na Rússia, demonstrando que sanções internacionais, direcionadas e comerciais são eficazes como instrumento de ação política.

O principal argumento sustentado com respeito às sanções é que são eficazes em seus propósitos de coagir, limitar ou apontar um objetivo diante do Estado sancionado. Por isso, assistimos atualmente os esforços da União Europeia e de outros Estados, fundamentalmente os Estados Unidos e o Reino Unido, para reduzir a capacidade do Kremlin de atingir seus objetivos ⁣diante da impossibilidade de acessar seus recursos essenciais.

As sanções exigem o que já se conhece em Bruxelas como “paciência estratégica” porque é preciso muito esforço na sua concepção e definição para procurar o consenso de todos os Estados-Membros e, além disso, demora muito para alcançar o efeito desejado. Vimos o exemplo mais claro na tentativa de reduzir a dependência energética da União Europeia em relação à Rússia, que deu origem a inúmeras conversações entre os países do G7 para a adoção do sexto pacote de sanções, precisamente porque temiam o efeito bumerangue que poderia ser gerado nos interesses ocidentais se a proibição de compra e transporte de petróleo, gás e carvão gerasse graves danos aos Estados-Membros no acesso à energia e aos combustíveis sólidos. 

Meses atrás, a União Europeia iniciou várias tentativas de proibir o transporte de petróleo bruto russo e direcionou o setor marítimo e, portanto, o setor segurador. Como se sabe, a maior parte das exportações de petróleo da Rússia é transportada em navios-tanque e mais da metade da tonelagem de bandeira reside em países como Malta e Grécia, que desde o início não acolheram a restrição ou proibição de embarques de petróleo bruto, juntamente com a Hungria e outros países da Europa Central e Oriental. Uma proibição efetiva, disseram eles, envolveria países como os Estados Unidos e o Reino Unido, para poderem exercer sua influência sobre nações onde há muitos navios embandeirados, como Libéria ou Panamá. A verdade é que nem os Estados Unidos nem o Reino Unido se mostraram reticentes a esse respeito. Tanto um quanto o outro aprovaram a restrição das exportações de petróleo russo para entrada e consumo em seus territórios no dia 8 de março deste ano. De forma mais lenta e tímida, a Europa o fez até conseguir aprovar o sexto pacote de sanções em 3 de junho de 2022.

O braço executivo da União Europeia proibiu as companhias de seguros e resseguros europeias de fornecer os seguros e serviços financeiros necessários para o transporte de petróleo russo. Os seguros marítimos demonstraram ser uma peça fundamental nesse tabuleiro. Os principais clubes de Proteção e Indenização (P&I) e as principais seguradoras de transporte marítimo que cobrem as responsabilidades de terceiros, sãogeridos a partir do Reino Unido, da União Europeia e Noruega, Estados Unidos e Japão, e cobrem 90% dos navios de navegação marítima. A maioria dos portos exige que os navios tenham a certificação P&I e, como era de se esperar, os compradores de petróleo russo ficariam muito relutantes em aceitar reclamações que poderiam chegar a centenas de milhões de dólares sem cobertura de P&I. Foi necessário, nesse sentido, convencer o Reino Unido a aderir à medida de proibição dos serviços financeiros, dada a importância do mercado de seguros do Lloyd’s, e introduzir uma ação coordenada e a proibição dos serviços financeiros marítimos por parte da União Europeia, EUA e o Reino Unido.

Foi essa ação coordenada que levou à proibição da exportação de petróleo russo para os territórios da União Europeia. Já não é possível justificar, como consta do artigo 5aa do Regulamento do Conselho 2022/428, de 15 de março de 2022, que a compra de petróleo era “estritamente necessária” para a sua entrada em um Estado-Membro. Elimina-se, assim, esta exceção, que era a porta de entrada para a compra de petróleo de países como Hungria, Eslováquia ou República Checa. Atualmente e desde que o sexto pacote de sanções foi aprovado, as exportações são proibidas e permitidas apenas durante janelas ou períodos de trégua para preservar direitos adquiridos em transações comerciais imediatamente anteriores à vigência das sanções.

A verdade é que a crise energética voltou a destacar a importância das entidades seguradoras e resseguradoras tornando-se necessário estabelecer medidas coordenadas entre instituições públicas e privadas para implementar eficazmente as políticas de sanções internacionais e garantir o seu cumprimento e eficácia. O cumprimento das sanções é prova mais do que evidente da gestão ética e responsável do setor apesar de suas capacidades no tráfego comercial terem sido restringidas e limitadas, com as proibições ou restrições adotadas no setor marítimo e na aviação. Logicamente, as seguradoras e resseguradoras não querem ser expostas a uma possível sanção por violar sanções internacionais, razão pela qual estabelecem medidas e procedimentos adequados de controle interno e de gestão que garantam suficientemente o cumprimento; mas, além disso, seu compromisso com a sociedade e com os códigos de governança que a regem, revelam sua importância e solidez para ajudar a comunidade internacional a respeitar os direitos humanos e no objetivo de avançar cada vez mais para uma sociedade mais sustentável.

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