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As reações dos mercados frente ao COVID-19 e seu reflexo nas cláusulas de seguro e resseguro

A crise do COVID-19 está gerando uma situação excepcional para as grandes corporações empresariais no âmbito mundial. Hoje, fazer qualquer tipo de previsão sobre o que acontecerá nos próximos meses, e sem nenhum precedente de iguais ou similares características em que nos basear, resulta muito difícil a médio e longo prazo. A verdade é que tanto o setor segurador em geral como as grandes organizações empresariais têm expressado uma grande preocupação em comprovar se os programas de seguro se adequarão ou não ao cenário de riscos que estamos vivendo.

“A Associação do mercado do Lloyd´s de Londres publicou recentemente os modelos de cláusulas de exclusão de epidemias, pandemias e doenças transmissíveis, para a orientação e assessoramento dos seus membros.”

A maioria das companhias seguradoras e resseguradoras estão adotando uma estratégia de “esperar e ver”. O resultado mais provável no qual se está trabalhando em alguns países como os Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha é a criação de fundos comuns apoiados pelos governos, como os já existentes para as desastres naturais e o terrorismo, mas enquanto se avança, surgiu nos mercados internacionais a discussão sobre se os contratos de seguro e resseguro de grandes riscos devem incorporar as conhecidas cláusulas de pandemias ou epidemias.

A Associação do mercado do Lloyd´s de Londres (LMA, por suas siglas em inglês) publicou recentemente os modelos de cláusulas de exclusão de epidemias, pandemias e doenças transmissíveis, para a orientação e assessoramento dos seus membros. As cláusulas publicadas e que se estão incluindo nos contratos são a LMA 5393 para as apólices de seguro direto do ramo de Property, a LMA 5394 para os contratos de resseguro, também do referido ramo, e a LMA 5395 para as apólices de Responsabilidade Civil.

“O resultado mais provável em que se está trabalhando em alguns países é a criação de fundos comuns apoiados pelos governos”

A incorporação destas cláusulas nos contratos em virtude do COVID-19 não nos pode levar a considerar que tudo o que não estava expressamente excluído nas condições estava coberto pela apólice. Pensemos, por exemplo, nas apólices de Danos
Materiais e Perda de Lucros. A garantia de perda de lucros só se ativa após a ocorrência de um dano material garantido sob o contrato. Aqui é onde surge a primeira reflexão com relação aos sinistros de perda de lucros e o novo coronavírus: a interrupção que dá lugar à perda de lucros deriva de um dano material? Cada caso será diferente e, sobretudo, será preciso analisar as condições concretas de cada apólice para poder dar uma resposta. No entanto, conforme a definição de dano material como “deterioração ou destruição da coisa assegurada”, não parece lógico pensar que o coronavírus por si só possa ser considerado dano material para efeitos da apólice, portanto, também não seria apropriada a ativação da cobertura de perda de lucros.

Outro dos problemas que podem afetar as apólices de Danos e de Interrupção de Negócio é que se considere a contaminação provocada pelo COVID-19 como dano material. Será relevante, nestes casos, considerar se a exclusão de contaminação que tipicamente se encontra nestas apólices – sobretudo de Property – poderia ser aplicada, da mesma forma que as cláusulas que excluem os danos derivados de qualquer tipo de “vírus ou bactérias”. Logicamente, os equipamentos e instalações contaminados deverão fazer parte dos bens assegurados pela apólice e a origem da contaminação (o coronavírus), deve ser um risco coberto ou, nas apólices de cobertura completa, não estar excluído.

Por isso, em nossa opinião, qualquer cláusula como as propostas pelo mercado do Lloyd’s, que determine com claridade que uma reclamação não terá cobertura por uma doença transmissível, originada por um vírus, uma bactéria, um parasita ou qualquer outro organismo, será sempre de mais fácil aplicação e ajudará a ganhar em segurança jurídica diante de possíveis confrontações com os clientes na interpretação das condições.

Por isso e porque as reclamações por COVID-19 já são uma realidade. Em 17 de abril de 2020 um grupo de restaurantes de Pittsburgh apresentou uma class action contra a companhia seguradora Erie Insurance Exchange alegando que a companhia havia negado injustamente a cobertura dos danos causados pelo COVID-19 em restaurantes, bares e outros estabelecimentos.

“Recomendamos regular com precisão o que está coberto e o que não pelo contrato de seguro e resseguro e evitar a incerteza que uma reclamação pelo COVID-19 nos possa gerar”

Também no Estado da Pennsylvania sabe-se de uma ação coletiva contra a companhia farmacêutica Inovio Pharmaceuticals após a declaração de seu CEO nos meios de comunicação, anunciando que sua empresa tinha desenvolvido uma vacina contra o vírus. Após esta declaração as ações da companhia cresceram rapidamente, mas mais tarde, um relatório independente confirmou que a realidade era bem diferente. Neste caso, parece que sem a aplicação de uma exclusão, os seguros de Responsabilidade Civil de administradores e diretores poderão ver-se muito afetados, da mesma forma que acontecerá em outras linhas de negócio.

Deve-se pensar também nos seguros de Responsabilidade Civil onde as medidas adotadas pelo Estado de alarme têm um forte impacto. Sem dúvida estas medidas afetarão as relações comerciais e serão muitas as situações nas que alguma das partes contratantes não poderá atender seus compromissos contratuais em tempo e forma. Se a apólice não contivesse nenhuma exclusão relativa a força maior ou evento extraordinário que limitasse a cobertura de uma possível reclamação de um terceiro decorrente do COVID-19, poderia ser objeto de cobertura desde que se provasse a responsabilidade por parte do segurado.

Por tudo isto e pelo que veremos nos próximos meses, recomendamos regular com precisão o que está coberto e o que não pelo contrato de seguro e resseguro e evitar a incerteza que uma reclamação pelo COVID-19 nos possa gerar.

Laura González

Deputy Director of the Legal Area Unidad Global Risks

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