Home > Revista Gerência de Riscos e Seguros > Estudos > Amônia: uma solução imediata para a descarbonização naval
Amoniaco

Amônia: uma solução imediata para a descarbonização naval

A amônia, tradicionalmente utilizada na agricultura e na indústria, tem atualmente um potencial muito importante como combustível naval. Neste artigo, analisamos os desafios enfrentados pela adaptação tecnológica e seu papel na descarbonização do setor marítimo.

Para abordar esta questão, contamos com a colaboração de José Ramón Freire, diretor geral da Associação Espanhola do Amoníaco Renovável.

A Organização Marítima Internacional está comprometida com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 13 das Nações Unidas que busca combater a mudança climática e seus efeitos. No contexto da atividade marítima, isto implica tomar medidas que melhorem a eficiência energética dos navios. A adoção do amoníaco renovável como combustível poderia ser essencial para conseguir uma descarbonização parcial da indústria, embora este propósito acarrete o desafio de realizar certas mudanças e adaptações.

“Quando falamos sobre combustíveis alternativos aos convencionais, um dos aspectos mais delicados é o relativo ao bunkering (ou seja, os processos logísticos para armazenar e fornecer este combustível), já que os processos de implementação das infraestruturas logísticas costumam ser difíceis e caros”, explica o especialista.

Não obstante, a disponibilidade global deste produto (presente em mais de 120 portos) e suas condições físicas (transportado em estado líquido a temperatura ambiente com pressões relativamente baixas para facilitar seu manuseio) fazem com que o amoníaco conte com uma posição favorável em relação a outros combustíveis, como o gás natural (GNL) ou o hidrogênio. Além disso, como indica Freire: “tem a vantagem de não precisar de uma fonte de CO2 biogênico e possui uma logística estabelecida, o que o posiciona como uma opção muito viável”.

 

Os desafios de sua implementação

Como mencionado anteriormente, muitas das principais infraestruturas portuárias do mundo já contam com os sistemas adequados para armazenar amoníaco, o que o posiciona favoravelmente para ser utilizado como combustível. No entanto, a implementação nos navios pode ser mais complexa. Segundo o especialista: “São necessários desenvolvimentos tecnológicos em motores de combustão dupla ou, inclusive, soluções completamente novas para que seja uma opção viável”.

Um dos principais obstáculos para seu uso como combustível é o seu preço, especialmente quando se produz de maneira renovável a partir de hidrogênio verde. O processo é mais caro que o dos combustíveis fósseis e, além disso, é necessária uma maior quantidade de produto para substituir o obtido a partir de hidrogênio cinza. Isto significa que as indústrias que atualmente utilizam amoníaco competirão nas primeiras fases de implementação por acessar esta versão renovável. Apesar destas dificuldades, Freire assinala que este desafio poderia ser uma oportunidade: “À medida que se escale a produção de amoníaco renovável, o gasto poderia diminuir, facilitando sua adoção como combustível em grande escala”, afirma.

Uma das medidas propostas por este especialista em técnicas energéticas para que o amoníaco se torne competitivo é a implementação de subsídios, uma tributação diferenciada e outros incentivos que reduzam seu custo e promovam seu uso, além de acordos regulatórios internacionais. “Embora a Espanha seja relativamente competitiva na produção de hidrogênio verde, o preço ainda triplica o custo do hidrogênio fóssil”, explica.

 

Desafios técnicos e de segurança

O uso da amônia como combustível não está isento de riscos e desafios técnicos. De forma análoga ao que ocorreu com o GNL, que inicialmente foi utilizado em grandes navios metaneiros, as companhias marítimas que operam navios movidos a amônia posicionam-se na vanguarda desse futuro promissor, transportando o produto com grande conhecimento e segurança. Para acompanhá-las nesta travessia, demandam os fabricantes de motores “soluções com amônia para a propulsão “, à qual se está respondendo, em uma primeira fase, com motores que utilizam metanol, já que requer um menor esforço tecnológico de adaptação. No entanto, apresenta a desvantagem de não estar tão disponível nos portos.

Em qualquer caso, trata-se de uma carreira de fundo. Embora os navios que atualmente transportam amônia já contam com conhecimentos sobre sua gestão, a propulsão em navios comerciais precisa de desenvolvimentos adicionais: “A implantação como combustível global exigirá conscientização e treinamento. Nem sempre o caminho mais fácil é o que te coloca na liderança. Nesta corrida por inovação, adaptação e descarbonização, os mais experientes e comprometidos, como empresas de navegação, portos, estaleiros e tecnólogos, fortalecerão sua posição de liderança, afirma.

A prova de que essa pode ser uma alternativa técnica e operacional está em marcos como o alcançado pelo Fortescue Green Pioneer, o primeiro navio oceânico movido a amônia: “Esse avanço incentivará outros fabricantes de motores e armadores a investir em tecnologias de propulsão adaptadas; trata-se de um sucesso crucial para demonstrar que estamos falando de uma solução escalável e economicamente viável”, assegura Freire.

 

Futuro do mercado de amônia

O progresso da amônia como combustível marítimo está em pleno desenvolvimento, e no curto prazo é provável que vejamos cada vez mais corredores verdes e navios de teste, possivelmente associados ao próprio transporte do produto: “Haverá competição entre amônia, metanol e GNL, e alcançar as escalas necessárias exigirá a definição e priorização de alternativas por setores,” afirma Freire. À medida que esses primeiros avanços se consolidem, será necessária uma regulamentação internacional mais abrangente, que crie os incentivos necessários para reduzir custos e aumentar a produção.

Sua consolidação no setor marítimo acontecerá em paralelo aos avanços tecnológicos: “É imprescindível desenvolver métodos de produção mais baratos e menos intensivos em energia, motores eficientes e limpos, além de melhorar e padronizar o manuseio da amônia para mitigar riscos operacionais e ambientais,” ressalta o especialista. Ele também destaca que, para isso, será necessário um rigoroso processo de análise e um apoio decisivo, envolvendo colaboração entre governos, organismos internacionais, a indústria marítima e a comunidade científica.

 

Este artigo teve a colaboração de…

José Ramón Freire

José Ramón Freire é Engenheiro Superior Industrial pela UPM em Técnicas Energéticas, com diversos mestrados em energia, finanças e gestão de pessoas. Atualmente, é diretor-geral da Associação Espanhola de Bioetanol, da Associação Espanhola de Amônia Renovável e secretário-geral da Associação de Comércio Exterior de Cereais. Além disso, atua como consultor energético e é sócio-fundador da Linze Vehículo Eléctrico e da Eris Solar.
Iniciou sua carreira na Andersen Consulting. Foi diretor geral, presidente e conselheiro de diversas empresas de cogeração, tratamento de resíduos e biomassa.

donwload pdf
Evolução da Gestão de Riscos na indústria madeireira

Evolução da Gestão de Riscos na indústria madeireira

Nas últimas décadas, a gestão de riscos nas fábricas passou por uma notável evolução. Nesta ocasião, focamos na indústria da madeira. A transformação da Gestão de Riscos no setor madeireiro permitiu integrar a perspectiva de riscos em todos os âmbitos de gestão, tanto...

ler mais
Lições aprendidas após a pandemia: cibersegurança

Lições aprendidas após a pandemia: cibersegurança

Os confinamentos e a restrição de movimento que se viveram durante a pandemia de COVID-19 marcaram um ponto de inflexão na transformação digital da economia, forçando empresas e instituições a se adaptarem a um cenário tecnológico sem precedentes. O teletrabalho, os...

ler mais
Diário de um engenheiro. Visita a uma fábrica de madeira

Diário de um engenheiro. Visita a uma fábrica de madeira

A Engenharia de Conta da MAPFRE Global Risks se caracteriza pela alta qualificação dos profissionais e pela alta qualidade das recomendações e requerimentos. É um exame duro que o Cliente valoriza muito. Na Área de Engenharia da MAPFRE Global Risks, queremos divulgar...

ler mais