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A sustentabilidade industrial começa no design

A sustentabilidade deixou de um valor agregado para tornar-se um objetivo inevitável das grandes indústrias. Tanto o mercado como os governos ampliaram suas exigências ambientais, e as empresas procuram reduzir seu impacto no meio ambiente agindo na fase mais inicial: o design.

A transição ecológica converteu-se em um objetivo completamente paralelo ao desenvolvimento econômico e social. Como explica Jose María Fernández Alcalá, diretor de economia circular da Ihobe (Sociedade Pública de Gestão Ambiental do Governo Basco), “a sustentabilidade está tanto na mentalidade de empresas e consumidores como nas agendas políticas”, cada vez mais conscientes dos problemas ambientais gerados por nossa forma de produzir e consumir.

A legislação e os controles de qualidade estão aumentando as exigências sobre os produtos à venda no mercado, criando um novo paradigma de economia circular. Como indica o especialista, a aposta da Europa é clara, e a prova disso é o Pacto Verde Europeu, um conjunto de propostas para adaptar as políticas da UE em matéria de clima, energia, transporte e fiscalidade, de forma reduzir as emissões de gases do efeito estufa em pelo menos 55% até 2030.

 

As chaves do ecodesign

Neste contexto, o design desempenha um papel fundamental, já que “80% do impacto ambiental que um produto vai ter ao longo de sua vida é definido nesta fase”, afirma Fernández Alcalá. Algumas das soluções ecologicamente inovadoras focam na quantidade e no tipo de matéria-prima empregada. O especialista esclarece que as estratégias utilizadas na economia de materiais têm dois enfoques diferenciados:

– O primeiro e mais tradicional foca em definir os tipos de material incorporados às peças e componentes do produto, priorizando, sempre que possível, o uso de materiais de origem renovável, em vez de recursos finitos. Se for preciso usar o material do segundo tipo, são priorizados aqueles de origem reciclada. “Um segundo eixo de atuação busca um design que permita diminuir ao máximo a matéria-prima empregada. Isso envolve não só o próprio produto, mas também os consumíveis usados ao longo do seu ciclo de vida, ou o sistema de envase e embalagem, na fase de transporte e distribuição”, explica o dirigente do Ihobe.

– A segunda estratégia está associada aos princípios de circularidade, com base no aumento da durabilidade do produto. “O objetivo final é que o produto precise da menor quantidade de matéria-prima. Quando desenhamos produtos que duram mais tempo, o peso da unidade de fabricação tende a ser maior que no caso dos produtos de vida curta. Isso ocorre porque usamos mais material, para que suas peças sejam mais robustas e resistentes. No entanto, se analisarmos o produto por unidade de uso, comprovaremos que esse aumento no consumo de material é amplamente compensado pelo aumento de sua vida útil”, adverte.

Possíveis estratégias de atuação vinculadas ao ecodesign. Fonte: Ihobe

Como se vê, o desenvolvimento de estratégias de atuação vinculadas ao ecodesign aborda esses objetivos de sustentabilidade isoladamente. “Para poder dimensionar adequadamente o sistema de um determinado produto, é preciso analisar todo o seu ciclo de vida”, explica o especialista, lembrando que ao longo de cada fase “tanto são consumidas matérias-primas e energia (entradas), como são gerados emissões, dejetos e resíduos (saídas)”.

 

Gestión de residuos

Jose María Fernández Alcalá reconhece que, quando desejamos alcançar a economia circular, tendemos a focar os esforços unicamente no aproveitamento dos resíduos gerados pela atividade industrial, ou então na reciclagem. Sem dúvida, é uma estratégia positiva. Não é economia, o que se tenta é reciclar o máximo possível. Mas o ecodesign vai bem mais além. “Muitos dos produtos que se convertem em resíduos foram tão mal projetados que é praticamente impossível aproveitar as matérias-primas contidas neles. Em outras palavras, é bem mais fácil reciclar um produto projetado para esse fim”, afirma. Isso pode ser conseguido, por exemplo, analisando os tipos de material que compõem o produto final e estudando como eles seriam separados ao final de sua vida útil.

Para conseguir essa importantíssima mudança, é necessário um compromisso por parte das empresas que ainda não foi alcançado. “Nas três últimas décadas, vimos a proliferação de estratégias premeditadas de desenho orientadas a encurtar a vida dos produtos. Trata-se da ‘obsolescência programada’, que busca uma falha precoce do produto para que ele seja rapidamente substituído. Ainda pior, há a ‘obsolescência percebida’, na qual o produto sequer chega a falhar. A psicologia do consumidor é manipulada para desejar substituir voluntariamente o produto, embora ele ainda tenha vida útil”, adverte. Neste ponto, também é possível tomar medidas que vão desde a prevenção de falhas técnicas até a facilitação das reparações.

 

Benefícios e impacto positivo do ecodesign

O design industrial orientado a objetivos ambientais tem sempre um impacto positivo no meio em que se desenvolve. Pode ser um impacto direto, por exemplo, quando as matérias-primas locais são priorizadas, ou indireto, já que ele pode ser produzido globalmente nos meios geográficos onde o produto será distribuído, usado e convertido em resíduo. Além disso, o especialista explica que, “graças à crescente conscientização dos consumidores, o ecodesign contribui com uma melhora significativa da competitividade da empresa que o aplica, pois melhora sua imagem diante de potenciais clientes”.

Em relação aos trabalhadores, “aplicar o ecodesign pode implicar a substituição de processos e materiais altamente contaminantes ou nocivos para a saúde. Isso também implica a melhora das condições de trabalho”, assegura o diretor de economia circular da Ihobe. Também podemos falar do impacto positivo no valor do produto, diante da rentabilidade para o empresário. “As matérias-primas são, em geral, o principal custo de produção. Por exemplo, nos custos industriais das empresas do País Basco, as matérias-primas representam 61% do total, enquanto, por exemplo, a mão de obra representa apenas 15%. Portanto, se otimizarmos o consumo de materiais, reduziremos custos em muitos casos”, expõe. Também aumenta o valor para o cliente, já que, de acordo com diferentes estudos, 78% dos consumidores europeus estão dispostos a pagar mais por um produto que demonstre seu respeito pelo meio ambiente.

Para terminar, Fernández Alcalá recorda que o ecodesign é um passo fundamental para atingir os objetivos dos principais governos do mundo em matéria de sustentabilidade e meio ambiente. “De acordo com dados da Fundação Ellen MacArthur, a plena aplicação dos princípios do ecodesign no âmbito da economia circular na Europa supõe a redução de 45% das emissões associadas aos produtos, o que significa uma redução líquida de 450 milhões de toneladas de carbono em 2030”, assegura, acrescentando também que isso implicaria uma economia de 600 bilhões de euros para as empresas da UE.

Tais benefícios só serão possíveis se os modelos de negócios no tecido industrial forem repensados, estudando novas ferramentas de medida e avaliação e, sobretudo, melhorando as habilidades técnicas. Outro desafio vem do mercado e do órgãos competentes. “É necessária uma atuação decisiva por parte do governo, para garantir que o consumidor disponha de informações verídicas, eliminar o chamado greenwashing, que não faz nada além de enganar e impedir que o consumidor diferencie um ecodesign de um simples engano. Se superarmos esses dois desafios, o ecodesign poderá ser o novo padrão de nossos mercados”, conclui.

 

Colaborou neste artigo:

Jose María Fernández Alcalá é diretor de economia circular na Ihobe, agência de meio ambiente do governo basco e responsável pelo Basque Ecodesign Center, aliança público-privada em ecodesign e economia circular de Euskadi. Conta com mais de 15 anos de experiência na iniciativa privada e na administração pública. Engenheiro mecânico industrial pela Escola Superior de Engenharia de Bilbao (UPV), ele obteve um diploma de Estudos Avançados do mesmo centro pelo trabalho “Engenharia do Desenho Ecológico de Produtos Industriais”. Autor de numerosas publicações, é também membro de diferentes comitês técnicos da UE em Bruxelas e comitês nacionais e internacionais ligados ao design e à normalização de produtos.

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