“É estratégico que os gerentes de riscos colaboremos com outras áreas, para conferir estabilidade para nossa organização”
A mudança climática, as novas tecnologias, a globalização dos setores e a interligação da economia conformam um novo panorama mundial de ameaças. Como gerente de riscos corporativo de Ferrovial, um dos principais operadores globais de infraestruturas e gestores de serviços para cidades, e presidente da Iniciativa Gerentes de Riscos Espanhóis Associados (IGREA), Daniel San Millán nos explica como as companhias deveriam enfrentar todos estes desafios de maneira coordenada e eficiente.
1. Como se pode melhorar a conscientização sobre o risco nas grandes empresas?
Um aspecto relevante em todas as organizações é melhorar sua cultura respeito do risco. Neste sentido, há dois caminhos a seguir. Um deles estará em induzir essa cultura na organização, evidenciando os benefícios do planejamento e controle do risco, através de figuras como o seguro ou os métodos alternativos de caráter interno. O outro caminho deve ser o da colaboração com outras áreas da empresa envolvidas no conhecimento e controle do risco, como os departamentos de Auditoria Interna ou as áreas de Proteção e Segurança, refletindo o valor agregado que oferece o Gerenciamento de Riscos Interno.
2. Por que é fundamental para uma grande empresa contar com um gerente de riscos?
A vida das empresas não só se sustenta com sucessos econômicos e lucros para seus acionistas e para a sociedade em geral; também estão presentes as crises, os desastres naturais, as perdas de mercado, os processos de terceiros e dos próprios acionistas, ou simplesmente um incêndio em uma instalação estratégica. Portanto, as situações de crise estão presentes no normal desenvolvimento da empresa e isso significa que deve existir um grupo de profissionais cujo principal objetivo seja o estudo e a implementação de uma metodologia adequada para neutralizar essas situações do ponto de vista econômico e financeiro, disponibilizando para sua empresa os fundos necessários para o restabelecimento da normalidade.
Isto pode ser alcançado de diferentes maneiras e essas metodologias são, e devem ser, o eixo do gerente de riscos, quem as implementará, desenvolverá e encorajará em sua organização.
3. Quais são as principais funções que deve empreender um gerente de riscos?
As funções podem variar segundo a organização, mas há algumas que são intrinsecamente responsabilidades indelegáveis, como o conhecimento, controle e financiamento dos riscos. Este trabalho pode ser desenvolvido com maior ou menor intensidade, em função dos recursos financeiros disponíveis, dos objetivos assumidos na função do gerente de riscos e da própria cultura da organização onde o trabalho é realizado.
“Os gerentes de riscos devemos implementar uma metodologia adequada para neutralizar situações de crise, disponibilizando para as empresas os fundos necessários para o restabelecimento da normalidade”
4. Quais são os riscos mais importantes que devem enfrentar?
Neste campo, acredito que seja preciso sermos ambiciosos e não reduzir motu proprio nossos objetivos. Quero dizer que deveríamos estar presentes em todos os órgãos da empresa onde se fale em riscos.
Por exemplo, há certa resistência a que gerentes de riscos emitam opinião sobre riscos regulatórios, de mercado ou financeiros. Muitos deles podem, graças a sua formação e a própria experiência, apresentar ideias, experiências e iniciativas que ajudem outras áreas da empresa, como os serviços jurídicos, o departamento financeiro ou novos produtos. Acredito que é uma questão estratégica, como mínimo, ter a possibilidade de colaborar com outras áreas para alcançar objetivos compartilhados, como conferir estabilidade a nossa organização. Para isso, tona-se necessária a colaboração do setor segurador ou a potencialização das sociedades cativas, capazes de superar a linha divisória entre riscos seguráveis e não seguráveis, e o potenciamento dos denominados riscos paramétricos através das sociedades cativas.
5. Como é sua relação, como gerente de riscos do Grupo Ferrovial, com os agentes do setor segurador?
Nossa relação com o mercado em geral é “normal” e ótima do ponto de vista operacional. De uma perspectiva institucional, é de máxima colaboração e, portanto, de apoio e consideração. Respeito ao nosso papel como contratantes ou consumidores de seguros, para meu grupo de empresas é o que deve ser, nem mais nem menos que de colaboração e aproveitamento dos produtos que são oferecidos.
6. Que solicitam às seguradoras?
Nossa demanda fundamental é, entre todos, alcançar um sistema mais eficiente no gerenciamento e resolução de sinistros. As seguradoras contribuem com muito dinheiro para compensar seus clientes pelos sinistros sofridos, mas existe certa sensação de que às vezes há pouca agilidade e, mesmo parecendo um pouco exigente, acredito que seja necessário cuidar mais desses processos e conseguir o envolvimento das partes: o segurado em tudo o que deve melhorar e o segurador disponibilizando mais meios, se for o caso, para melhorar seus processos.
“É preciso oferecer respostas adequadas para os riscos críticos que afetarão as empresas através de novos métodos de financiamento de riscos”
7. Como percebe seu trabalho e envolvimento no negócio nas diferentes regiões do mundo?
Percebo-o como um desafio de enorme complexidade. Para os gerentes de riscos, a internacionalização de nossas empresas representou um desafio em muitos aspectos: diferentes legislações, mercados mais ou menos complexos, organizações de serviço com diferentes aptidões, riscos intensificados em muitas regiões, etc.
É preciso estarmos preparados e trabalharmos muito para que todas as fichas encaixem no tabuleiro e, nesta questão, seguradoras e corretores desempenham um papel fundamental. Só gostaria de solicitar que as organizações que prestam serviço através de programas de seguros centralizados trabalhem e mobilizem suas organizações pensando nos interesses de seus clientes, disponibilizando soluções não só de seguros, mas também de caráter logístico, regulamentar e de gestão do programa.
8. Quais países ibero-americanos estão mais desenvolvidos na gestão de riscos?
Todos ou quase todos são de ponta; a internacionalização e globalização dos negócios facilitaram esta questão. Cada um deles tem suas particularidades; devemos entendê-las e nos adaptar a elas.
9. Como incide a interconectividade global na potenciação da figura do gerente de riscos?
Incide de forma muito importante, porque essa interconectividade oferece muitas vantagens e algum inconveniente, mas é imprescindível para trabalhar em tempo real e para fornecer respostas operacionais e eficientes. Não imagino trabalhar sem essa vantagem que as novas tecnologias oferecem, e que deram lugar a uma nova maneira de fazer negócios.
10. Quais são os principais desafios futuros enfrentados pelos gerentes de riscos?
Esta é uma pergunta difícil de responder e poderia servir para outras profissões. Mas, se fizermos um esforço de especificação, é preciso dizer que devemos ser capazes de oferecer respostas para os novos desafios globais, como a globalização em si mesma, a mudança climática, as novas tecnologias e, especialmente, agir de forma adequada e eficiente perante riscos críticos que afetarão nossas empresas através de novos métodos de financiamento de riscos em parceria com o mercado. Contudo, estes desafios não são exclusivos de nossa profissão; eles afetam muitas outras. Nesse sentido, não me sinto apontado absolutamente como responsável pelos riscos de uma grande empresa, mas sim gostaria de acrescentar que os mercados segurador e financeiro, em geral, têm de dar respostas para os novos riscos, apresentando soluções que possam conferir serenidade e confiança.
Daniel San Millán del Río é bacharel em Direito pela Universidade Complutense de Madri, com mestrado em Direito Financeiro e Tributário pelo Centro de Estudos Tributários e mediador de seguros formado pela Diretoria Geral de Seguros.
Sua experiência profissional se circunscreve ao setor segurador. Em Central Hispano Broker foi responsável pelo Departamento de Sinistros e, após a fusão com o Grupo Santander, executivo de Grandes Contas. Posteriormente, ele trabalhou em Aon Corporate Business como diretor de Contas de Construção e diretor de Construção, até sua incorporação no Grupo Ferrovial, onde é gerente de riscos corporativo desde 2004. Dentro desta organização desempenhou atividades de manager em empresas filiais de resseguro, como Alkes Reinsurance, Kryton RE, Anmey UK e Heathrow Airport Holding.
No âmbito acadêmico, foi professor de Direito Segurador, Seguros de Ramos Técnicos (Construção e Engenharia) e Responsabilidade Civil na Companhia para a Formação Empresarial (CFE), professor de Práticas de Gerenciamento de Riscos no Mestrado de Seguros da Fundación Mapfre e, desde 2013 até hoje, atua como professor de Práticas de Gerenciamento de Riscos no Mestrado de Seguros em ICEA.
No plano associativo, foi vice-presidente de Agers, de 2007 a 2009, quando fundou IGREA, iniciativa onde é presidente na atualidade.