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“A força do sistema financeiro peruano permitiu mitigar os riscos macroeconômicos ocasionados pela crise sanitária”

Como explica Aurelia Ramírez Quiroz, gerente da Câmara de Comércio do Peru na Espanha, o investimento é um componente fundamental do desenvolvimento econômico do país, já que representa cerca de um quarto do PIB anual. Apesar de o impacto da pandemia ter afetado esses números, como no resto do mundo, a região está conseguindo alcançar uma recuperação firme que poderá levar ao retorno dos níveis anteriores à pandemia no final deste ano de 2022.

Você poderia nos dar uma breve ideia do impacto da pandemia no país? Como está sendo a recuperação?

Como em outros países, houve grandes perdas na economia, além do elemento político caracterizado pela incerteza. A pandemia afetou os grandes condutores da economia: investimento público, investimento privado (que caiu cerca de 27%), exportações (redução de 13% apesar da melhora do preço dos minerais e do sólido crescimento do setor agroexportador), e consumo interno. Por outro lado, o déficit fiscal quintuplicou e, pela primeira vez nas últimas décadas, o Peru se endividou.

 Isso gerou uma recessão de 11,2%, comparável apenas à de 1880, durante a guerra com o Chile. Na América Latina, fomos a segunda economia com maior recessão, só superada pela Venezuela (25%). Ocorreu uma crise tripla: sanitária, econômica e política. Nossos pontos fracos ficaram evidentes, e espero que tenhamos aprendido lições importantes.

 Sem dúvida, a força do sistema financeiro e as medidas implementadas permitiram mitigar os riscos macroeconômicos ocasionados pela crise sanitária. Para evitar a ruptura da cadeia de pagamentos, o Banco Central de Reserva do Peru (BCRP) reduziu a taxa política monetária ao seu nível mínimo histórico. Em 2021, o PIB real reagiu fortemente e cresceu 13%, voltando ao nível anterior à pandemia. Esse crescimento foi impulsionado pela recuperação da demanda interna e as exportações, a flexibilização das restrições de mobilidade, a execução acelerada das obras públicas e a retomada de projetos de investimento privado.

 Como a pandemia afetou a entrada de investimentos? Qual é a situação atual e onde começou?

Investimento é um componente importante do PIB peruano. Segundo os números do BCRP, representa cerca de um quarto em cada ano da presente década. Assim, é o segundo componente mais importante após o consumo privado. O investimento privado dinamiza a economia, pois o seu maior fluxo aumenta os níveis de emprego e impulsiona o consumo. Portanto, seu comportamento tem impacto no crescimento econômico e no bem-estar social. 

Em particular, o investimento privado representa quase 80% do investimento bruto fixo há dez anos, segundo os números do BCRP. No entanto, devido à pandemia, em 2020 houve um retrocesso de 13,4% em relação a 2019. Espera-se que esse resultado seja revertido nos próximos anos graças à recuperação econômica.

Nesse sentido, é importante criar condições ideais para continuar atraindo IED, já que deste depende o crescimento da economia. O investimento privado é mais que relevante para garantir a reativação econômica, sobretudo partindo de um cenário pós-pandemia.

Quais são os principais incentivos que o Peru oferece para atrair investimentos estrangeiros?

Nas últimas duas décadas, o Peru consolidou-se como um destino atraente para investimentos estrangeiros. Está posicionado assim graças à política de abertura comercial desenvolvida até o momento e por ser membro da Organização Mundial de Comércio, do Foro de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico e da Comunidade Andina, tendo mais de vinte operações comerciais vigentes, quatro a entrar em vigor e seis em negociação.

 É evidente que para atrair IED é necessário um quadro normativo que outorgue garantias mínimas. Dessa maneira, o Peru oferece um tratamento igualitário aos investimentos nacionais e estrangeiros, sendo essa uma garantia estabelecida na Constituição.

 Você poderia falar sobre esse quadro normativo?

O DL N.º 662 oferece aos investidores estrangeiros a garantia de transferir livremente ao exterior e sem nenhuma autorização governamental, antes do pagamento de impostos, a totalidade de seus capitais, bem como dos dividendos ou dos lucros líquidos provenientes de seu investimento no país. Além das disposições da legislação interna, o Estado ratificou acordos internacionais com a finalidade de dar maior segurança aos investimentos estrangeiros. Sem dúvida alguma, o mais importante desses acordos, é o Convênio de Washington e a subordinação do Estado peruano ao Centro Internacional para a Resolução de Disputas sobre Investimentos (CIRDI – ICSID).

 Complementarmente, o Peru assinou diversos tratados bilaterais de investimento, tanto com países da sua região (Argentina, Chile e Colômbia, entre outros) como de outros continentes (Alemanha, França, Reino Unido e China, entre outros). Nessa linha, é importante mencionar o BIT assinado pelo Peru e a Espanha em 1994, estabelecendo que as partes garantirão em seu território um tratamento justo e equitativo aos investimentos da outra parte contratante.

Esses instrumentos internacionais complementam as garantias internas. A sua estabilidade jurídica faz com que seja considerado um dos países emergentes mais atraentes para investir na Latam, com base na solvência fiscal, nas reservas internacionais líquidas, na eficiente administração econômica e regulamentar e no excelente desempenho nos mercados internacionais.

 De onde procedem as principais injeções de capital?

Há mais de quatro décadas, o Peru recebe importantes fluxos de IED devido à integração comercial com diferentes economias do mundo. Com relação à evolução e composição, o IED, entre os anos de 2010 e 2020, acumulou US$ 86.306 milhões, o que mostra o atrativo do Peru tanto para os investimentos de empresas estrangeiras como locais, que nos últimos anos promoveram investimentos em diversos setores do país, gerando emprego.

 Assim, na década mencionada acima, o ano em que se realizou o maior desembolso foi o de 2012, com US$ 13.622 milhões. Enquanto em 2020, ano em que fomos atingidos pela crise provocada pela pandemia, o investimento estrangeiro direto registrou US$ 3.141 milhões, o que significou um retrocesso de 64,7% em relação a 2019.

 Segundo os indicadores oficiais e privados, entre os países com maior desembolso de IED estão a Espanha, o Reino Unido, o Chile, os Estados Unidos e os Países Baixos.

Existem projetos em andamento e compromissos de investimento com presença estrangeira até 2025 nos setores de mineração (US$ 58.092 milhões), transporte (US$ 13.684 milhões), eletricidade (US$ 8.358 milhões) e hidrocarbonetos (US$ 5.110 milhões).

 Quais são os setores de interesse na atualidade?

O Peru é sem dúvida um dos países mais atraentes quanto a oportunidades de investimento em setores estratégicos como a mineração, a infraestrutura, a energia ou a agroindústria. Existem projetos em andamento e compromissos de investimento com presença estrangeira até 2025 nos setores de mineração (US$ 58.092 milhões), transporte (US$ 13.684 milhões), eletricidade (US$ 8.358 milhões) e hidrocarbonetos (US$ 5.110 milhões).

 Somados a esses, temos investimentos nos setores de inovação tecnológica, comunicações, turismo, gastronomia e serviços. Em geral, o país é extremamente atraente em praticamente todos os setores produtivos.

 Conte-nos sobre projetos em gestação ou andamento que estão impulsionando o investimento.

A agência oficial de promoção de investimentos tem diversos projetos na carteira. Destacam-se o Anel Viário Periférico (com um valor de US$ 1.965 milhões), o Parque Industrial de Ancón (US$ 750 milhões), as Obras de Cabeceira e Condução para o Abastecimento de Água Potável em Lima (US$ 480 milhões) e dois novos Centros Hospitalares de Saúde em Piura e Chimbote (US$ 286 milhões). Também existem outros planos no âmbito viário, de água e saneamento, telecomunicações, transmissão elétrica e educação, como a construção de escolas de alto desempenho.

 A construção foi assinalada como um dos setores que impulsionarão a recuperação econômica do país. Você poderia nos fazer uma avaliação do potencial de infraestrutura e obras viárias?

O Peru implementou diversos mecanismos para a promoção de investimentos nestes setores, tais como as Associações Público-Privadas, o mecanismo de Obras por Impostos e, mais recentemente, os Acordos Governo a Governo, que têm como característica comum promover e fomentar a participação de investidores internacionais e locais em projetos de infraestrutura, com os quais a região pode se beneficiar da experiência de outros países na execução de projetos de grande envergadura e complexidade. Além disso, conta com o respaldo de ser um Estado estrangeiro com reconhecidos níveis de transparência, sendo que a obra contratada é concluída no prazo e com qualidade.

 O Plano Nacional de Infraestruturas de 2019 define a visão e os objetivos para o fechamento de lacunas na infraestrutura por parte do Estado peruano, sendo que para isso 52 projetos foram priorizados. Ao todo, somam um investimento aproximado de US$ 30 bilhões de dólares. Desses, quase a metade se encontra, atualmente, em etapa de execução contratual, e muitos deles com atrasos nos investimentos. Entretanto, a outra metade está pendente de ser adjudicada e/ou em diferentes fases do processo de licitação. Cabe realçar que 60% serão executados através de uma APP. Cumprir o cronograma de adjudicações dos novos projetos anunciados, como país, tanto para investidores nacionais e internacionais, também contribuirá para o impulso da reativação econômica. 

A Espanha é um sócio preferencial. Existe um compromisso e vocação de permanência das empresas espanholas no mercado peruano em setores importantes como telecomunicações, infraestrutura, energia ou agroindústria.

 Como contribui em particular o investimento espanhol para a economia peruana?

A Espanha é um sócio preferencial. Existe um compromisso e vocação de permanência das empresas espanholas no mercado peruano em setores importantes como telecomunicações, infraestrutura, energia ou agroindústria. Com relação a IED, a Espanha tem sido o principal investidor no Peru, seguido do Reino Unido, EUA e Chile, e nos últimos anos a China está assumindo um papel relevante.

 O Peru é atualmente o quinto país de destino do investimento da Espanha na Latam em termos do estoque de IED, acumulado em um valor aproximado de € 4.600 milhões. Cabe realçar o potencial e a competitividade das empresas espanholas nos setores mencionados, tanto as grandes como as PMEs. Até a presente data, há mais de 800 empresas espanholas instaladas no Peru, o que é uma boa amostra do compromisso que tem de ser parte ativa da modernização da economia peruana e da criação de emprego, gerando mais de 450 mil postos de trabalho diretos e indiretos no país.

 Quais as perspectivas da atividade econômica no país?

Para o fechamento de 2022 projeta-se que a economia peruana continuará se recuperando e espera-se um crescimento de 2,5% do PIB, impulsionado pela recuperação da demanda interna e das exportações. Por outro lado, espera-se que o déficit fiscal diminua em 3,5% até o fim do ano, alinhado com as metas fiscais.

Projeta-se que o crescimento econômico regressará aos níveis de antes da pandemia, em um ritmo de cerca de 3% ao ano, pois as melhores condições externas previstas seriam parcialmente compensadas pelos efeitos da incerteza política. Superar desafios estruturais relacionados ao amplo setor informal, a limitada diversificação econômica e a baixa qualidade dos serviços públicos em setores como saúde, educação, água e saneamento será um fator crítico para melhorar as perspectivas de crescimento no médio e longo prazo.

Finalmente, é necessário enfatizar que, levando-se em conta os desafios e os aspectos de melhora pendentes, o Peru possui pontos fortes institucionais que garantem um tratamento equitativo e seguro aos investidores e que os colocam em uma posição privilegiada entre os países ao seu redor.

 

Aurelia Ramírez Quiroz

Aurelia Ramírez Quiroz é licenciada em Direito e Ciências Políticas pela Universidade Nacional Pedro Ruiz de Lambayeque no Peru. Possui mestrado em Comércio e Finanças Internacionais pela Universidade de Barcelona. Atualmente, é gerente da Câmara de Comércio do Peru na Espanha.

É autora de diversas publicações sobre Comércio Internacional e Logística Portuária, e conferencista em auditórios acadêmicos e empresariais do Peru e da Espanha, bem como em outros países da América Latina e Europa.

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